Brésil, Brésils

Desde o momento em que soube que o ano de 2005 seria o Ano do Brasil na França, em fevereiro de 2003, comecei a imaginar um projeto em torno da música na época da Missão Artística Francesa, que chegou em 1816 ao Brasil.

A corte de D. João VI estava bem servida por músicos do quilate de José Maurício Nunes Garcia e Marcos Portugal, quando aqui chega, logo após a Missão Artística, o austríaco Sigismund von Neukomm (1778 – 1858). Aluno predileto de Haydn, Neukomm residiu no Brasil entre 1816 a 1821, período durante o qual compôs 45 obras, e foi professor de música do príncipe Dom Pedro e do autor do hino nacional, Francisco Manoel da Silva. Sua importância para a nossa música é capital: foi o primeiro a se utilizar de gêneros populares brasileiros, como a modinha e o lundu, em suas obras. Foi também quem harmonizou e fêz imprimir em Paris o álbum de modinhas brasileiras, da autoria do mestiço Joaquim Manoel da Câmara, o mais famoso virtuose do cavaquinho do início do século XIX.

A presença de Neukomm no Brasil foi estudada por todos os nossos grandes musicólogos, desde Mozart de Araújo, passando por Luiz Heitor Correa de Azevedo e chegando ao querido José Maria Neves, que foi quem me colocou na pista do compositor.

Pouco antes de falecer, José Maria deixou-me uma cópia do catálogo completo das obras de Neukomm em que estava trabalhando. Guiada por esse trabalho, iniciei uma longa pesquisa na Biblioteca Nacional da França, onde se encontram a maior parte dos manuscritos. Deparei-me com obras de grande qualidade artística, o que me entusiasmou ainda mais.

Dei notícias de minhas descobertas a algumas pessoas ligadas à realização do ano do Brasil na França, principalmente ao chefe da delegação francesa, Jean Gautier, e a seu grande amigo no Brasil, Romaric Sulger-Buel. Ao mesmo tempo, tratei de interessar Alain Pacquier, diretor do Centro Internacional dos Caminhos do Barroco, responsável pelo lançamento na França dos CDs Missa Pastoril – Nunes Garcia e Música Sacra do Brasil – Vox Brasiliensis, dos quais participei. A minha colaboração com Pacquier datava da época das comemorações dos 500 anos do Brasil, quando participei da programação dos concertos de música colonial brasileira na exposição sobre o Brasil Barroco no Petit Palais.

Consegui transmitir a esses importantes parceiros o entusiasmo pela idéia do projeto, que envolve a música que Neukomm escreveu no Brasil e também dos músicos com que aqui conviveu e que muito admirou - Joaquim Manoel da Câmara, de quem transcreveu as modinhas, e José Maurício Nunes Garcia, sobre quem escreveu: “De minha parte, considero uma obrigação utilizar a oportunidade para tornar esse homem conhecido em nosso meio cultural europeu…”

Inspirada pelo titulo de uma das peças que Neukomm aqui compôs em torno de um lundu e também pela amizade que nutria por Nunes Garcia, intitulamos o projeto de O Amor Brazileiro, assim mesmo, com “z”, como no manuscrito autógrafo da obra.

O projeto O Amor Brazileiro foi encampado por Alain Pacquier, que dele fez o tema do 5º Mês Nacional do Barroco Latino-americano, que acontecerá em novembro e dezembro por 30 cidades de todas as regiões da França. Ainda no âmbito do projeto, estão sendo gravados 3 CDs, consagrados à música de Nunes Garcia/Neukomm, a serem lançados em outubro pelo selo K. 617, distribuído mundialmente pela Harmonia Mundi.

 

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